terça-feira, 29 de maio de 2007

A Solidão é dos audazes...

A Solidão é dos audazes
O Amor é dos escolhidos,
não dos que escolhem, mas dos eleitos...
Eleitos por um outro coração que sabe que nada mais pode fazer para viver por inteiro sem aquele olhar, aquele sorriso, aquele cheiro...e as borboletas na barriga...
Quem viveu um grande Amor, não se basta com a possibilidade de vir a viver um outro.
Escolhe por companheiro a Solidão, e nalguns casos a Saudade...mas Saudade é má conselheira...a Solidão é fiel amiga...

Divide-se a vida entre a Solidão e o Amor esperando que eles não se encontrem, nunca num só mesmo coração.

Quando a Solidão é assaltada, é assaltada pelo Amor, mas por:
um Amor sólido, não porque ja o é, mas porque sabe que o será
um Amor puro, porque vem sem passado, sem dores remetidas ao esconderijo
um Amor honesto, porque não pensa porque será, sente que será
um Amor arrebatador, por ele não se esperava, não se ansiava
um Amor amado, porque quem foi assaltado pelo Amor, foi audaz, ouviu e se embalou na melodia da Solidão...

O Amor é dos escolhidos
A Solidão é dos audazes!!

Finalmente, como sempre, como antes,
encontrei o caminho de onde não devia ter saído!

domingo, 27 de maio de 2007

"Ganha-se a vida perde-se a batalha"

Nos trilhos obscuros que se atravessam, tudo se justifica, tudo se aceita, com uma passividade cruel de quem não pensa por si, mas pensa por todos!
Quero por isso mesmo homenagear os perdedores das inúmeras batalhas da vida, que nunca perderam a dignidade nem os seus valores, e que por isso mesmo ganharam a vida...todos os anónimos despojados de si para o ser para os outros sem se confundir com eles! Com um pensamento seu, construído pelos seus sacrifícios, dores, ensinamentos, euforias...alguém que é tão só igual a si, e nisto mesmo inimitável...
Faço uma homenagem aos homens e mulheres de rostos desconhecidos, porque não fizeram como os outros, pelo caminho dos outros, o "normal" caminho dos que pensam igual. Todos os que o negaram, que o negam e que o negarão até não conseguirem dizer mais não, até a sua boca se calar involuntariamente.
Às vezes torna-se difícil ser-se fiel a si mesmo sem pensar que somos um nada a remar contra tudo e todos, mas ninguém mostrou o caminho claro a quem ousa, e não se trata de um qualquer ousar, mas sim um ousar por acreditar...
Assim, muitos perderam batalhas, ganhando a própria vida...

sábado, 26 de maio de 2007

Raras são as palavras...

"O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo."
Dom Casmurro de Machado de Assis
Desperto para a literatura de forma sui generis, como que um acordar para um vício que sempre me habitou desde que me reconheço e me sinto...agora que não me conheço, nem me sinto invade-me a sede, de palavras que não são minhas, não são do meu tempo, do meu espaço, da minha realidade...mas só não o são, porque nasci, cresci e vivo em tempos espaços e realidades diferentes daquelas que leio. Desejei, por mais do que uma vez, ter sido eu a autora de tantas frases que nos esmagam, ou por acreditarmos que são verdades insofismáveis, ou por que queremos acreditar que acreditamos na sua veracidade insofismável...porque nos conforta. As verdades universais, as grandes frases, os grandes ditos fascinam o homem mais sedento, que se deixa ficar por breves momentos, iludido com a ideia de ter matado a sua sede...por milésimos de segundo! Nem que sirva unicamente para matar a sede por milésimos de segundo, muitos almejam ser os autores, os pensadores, a fonte das frases que confortam almas...partindo do princípio que estas existam.
Discorro estes pensamentos por não os querer conter mais em mim, não porque sejam importantes, mas porque não me apetece calá-los! Machado de Assis, pela graça do ano de 1899, antecipou-se e publicou as sábias palavras que eu gostava de ter escrito...

O mundo

"O mundo é pequeno pra caramba
Tem alemão, italiano, italiana
O mundo filé milanesa
Tem coreano, japonês, japonesa

O mundo é uma salada russa
Tem nego da Pérsia, tem nego da Prussia
O mundo é uma esfiha de carne
Tem nego do Zâmbia, tem nego do Zaire

O mundo é azul lá de cima
O mundo é vermelho na China
O mundo tá muito gripado
O açúcar é doce, o sal é salgado

O mundo caquinho de vidro
Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo tá muito doente
O homem que mata, o homem que mente

Porque você me trata mal
Se eu te trato bem
Porque você me faz o mal
Se eu só te faço o bem

Todos somos filhos de Deus
Só não falamos as mesmas línguas
Everyboby is filhos de God
Só não falamos as mesmas línguas
Everybody is filhos de Gandhi
Só não falamos as mesmas línguas."

Paulinho Moska,
porque há sempre alguém que lê os nossos pensamentos!
"Despite all my rage, I am still just a rat in a cage"

2º andar, direito

"Ele vinte anos, e ela dezoito
e há cinco dias sem trocarem palavra
lembrando as zangas que um só beijo curava
e esta história começa no instante
em que o homem empurra a porta pesada
e entra no quarto onde a mulher está deitada
a dormir de um sono ligeiro

E no quarto, às cegas,
o escuro abraça-o como a um companheiro
que se conhece pelo tocar e pelo cheiro
e é o ruído que o chão faz que lhe traz
o gosto ao quarto depois de uma rupturaf
faz-lhe sentir que entre os dois algo ainda dura
dos dias em que um beijo bastava

E agora, da cama
vem uma voz que diz sussurando: És tu?
e a luz acende-se sobre o braço nu
e a mulher pergunta: A que vens agora?
é que não sei se reparaste na hora
deixa dormir quem quer dormir, vai-te embora
amanhã tenho de ir trabalhar

Não fales, que o bebé ainda acorda
não grites, que o vizinho ainda acorda
e não me olhes que o amor ainda acorda
deixa-o dormir, o nosso amor, um bocadinho mais
deixa-o dormir, que viveu dias tão brutais

E o homem de pé
parece um rapazinho a ver se compreende
e grita e diz que ele também não se vende
que quer a paz mas de outra maneira
e nem que essa noite fosse a derradeira
veio afirmar quer ela queira ou não queira
que os dois ainda têm muito a aprender

Se temos...! diz ela
mas o problema não é só aprender
é saber a partir daí que fazer
e o homem diz: Que queres que responda?
Não estamos no mesmo comprimento de onda...
Tu a mandares-me esse sorriso à Gioconda
e eu com ar de filme americano

Somos tão novos, diz o homem
e agora é a vez de a mulher se impancientar
essa frase já começa a tresandar
é que não é só uma questão de idade
o Amor não é bilhete de identidade
é eu e tu, seja quem for, ter vontade
de mudar e deixar mudar

Não fales, que o bebé ainda acorda
não grites, que o vizinho ainda acorda
e não me olhes que o amor ainda acorda
deixa-o dormir, o nosso amor, um bocadinho mais
deixa-o dormir, que viveu dias tão brutais

E assim se ouviu
pela noite fora os dois amantes falar
e o que não vi só tive que imaginar
é preciso explicar que sou eu o vizinho
e à noite vivo neste quarto sozinho
corpo cansado e cabeça em desalinho
e o prédio inteiro nos meus ouvidos

Veio a manhã e diziam
telefona ao teu patrão, diz que hoje não vais
que viveste uns dias assim tão brutais
e que precisas de convalescença
sei lá, inventa qualquer coisa, uma doença
mete um atestado ou pede licença
sem prazo nem vencimento, se preciso for
(Espero que não seja preciso, porque não
sei como é que eles vão viver sem os dois
salários...)

Vá fala, que o bebé está acordado
o vizinho deve estar já acordado
e o Amor, pronto, também está acordado
mas tem cuidado, trata-o bem
muito bem, de mansinho
que ainda agora vai pisar outro caminho"

Uma capacidade inesgotável de brincar com as palavras, de contar histórias de forma inimitável com os pés na realidade!
O único, igual a si mesmo, fiel aos seus ideiais:
Sérgio Godinho!!:)